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domingo, 24 de julho de 2011

Museu dos EUA elabora maior base de dados da arte latino-americana


No diário de sua viagem ao Brasil, o poeta Blaise Cendrars anotou: "A terra é vermelha, o céu é azul". Tarsila do Amaral então ilustrou tudo sob os efeitos de "azul puríssimo, rosa violáceo, amarelo vivo, verde cantante".

"Feuilles de Route" (folhas do caminho), caderno que destrincha o roteiro da artista com o poeta francês por Minas Gerais e que deu origem à sua fase "Pau Brasil", é um dos 10 mil documentos que integram o mais ambicioso projeto de digitalização de textos e imagens relacionados à arte latino-americana.

Nos últimos sete anos, Houston foi o epicentro de um esforço que envolveu cem pesquisadores, espalhados por 14 cidades das Américas para reunir a maior base de dados de artistas latinos já compilada, tudo a um custo de cerca de R$ 78 milhões.

"Queremos percorrer as bases intelectuais da arte latino-americana", resume Mari Carmen Ramírez, curadora do Museum of Fine Arts de Houston (EUA), responsável pelo projeto. "Nossa esperança é que isso leve a uma transformação radical no entendimento da arte dessa região."

Radical porque documentos primários, de diários de artistas a artigos publicados e anotações pessoais, estarão acessíveis ao mundo todo pela primeira vez. Será uma base que permite cruzar dados sobre a produção desses autores ao longo do século 20.

"Isso nos leva a observar esses artistas a partir de outros ângulos", diz Ramírez. "Ajuda a estabelecer uma história comparativa da arte latino-americana, esclarecendo a relação entre os países."

ETAPA BRASILEIRA

Na primeira etapa do projeto, serão divulgados, até o fim deste ano, 3.000 documentos ligados a nomes dos Estados Unidos, México e Argentina. Em 2013, entram os 1.500 textos históricos que foram garimpados no Brasil.

Entre eles, clássicos como o "Manifesto Antropófago", de Oswald de Andrade (1890-1954), textos sobrearquitetura moderna escritos por Gregori Warchavchik (1896-1972), uma análise das construções do país feita por Le Corbusier (1887-1965) e publicações como a revista "Klaxon", espécie de bíblia dos modernos.

"São autores que marcaram o pensamento das artes no Brasil", diz Ana Maria Belluzzo, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que coordenou o braço brasileiro da pesquisa. "Tentamos reconstruir esse pensamento, mostrar a criação de uma linguagem."

Embora pesquisadores de cada país tenham autonomia, um roteiro geral de busca foi elaborado em Houston para dar unidade aos dados -uma lista de critérios do que interessa ou não ao projeto.

"Há uma lista de questões, não de artistas", diz Belluzzo. "A coisa mais importante é trabalhar esse universo."

Em paralelo ao projeto de Houston, a artista Letícia Parente acaba de ter sua documentação lançada on-line em leticiaparente.net, e os escritos de Lygia Clark devem ganhar a web em breve, numa parceria dos herdeiros da artista com a Universidade Federal de Minas Gerais.

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