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sábado, 4 de agosto de 2012

Museus, culturas, antropologias



O papel dinâmico das instituições museológicas é discutido na coluna de agosto do antropólogo Luiz Fernando Dias Duarte. Se no passado elas serviram para acolher o resultado das atividades exploratórias e às identidades nacionais, hoje ressurgem como focos locais de identidade e memória.

Museus, culturas, antropologias
O Museu Nacional foi fundado em 1818, em momento de valorização desses espaços. Sua história e os objetos que guarda refletem a complexa relação entre ‘natureza’ e ‘civilização’ que caracteriza a cultura ocidental. (foto: Acervo Museu Nacional)
Os sentidos do mundo que a antropologia explora se concentraram de início fortemente nos museus públicos que a cultura ocidental inventou a partir de finais do século 18. Inicialmente museus de ‘história natural’ ou de arte; logo seguidos dos museus de etnologia e folclore – incluindo os dedicados às culturas clássicas do Mediterrâneo e redondezas.
Eram instituições fundamentais para a autorreflexão ocidental, acumulando e organizando os materiais abundantes e variados que a intensificação da atividade científica e exploratória fazia acorrer para as instituições europeias; mas também recolhendo e interpretando os materiais, igualmente abundantes, de que a história do próprio Ocidente entulhava os sótãos, os depósitos, as galerias.
O novo sentido da história, linear e acumulativa, que se impusera em nossa cultura a partir do Renascimento, fora propulsionado intensamente pelo culto iluminista do progresso, associado a uma intensa preocupação com o estatuto da humanidade, com suas origens, seu desenvolvimento, sua tradição.
O movimento romântico amarrou cuidadosamente os fios da atenção ao passado, reforçando as iniciativas que redundariam na arqueologia, na linguística, na antropologia, na história e nos estudos de folclore.
Paralelamente, a intensificação da pesquisa naturalística, com a descrição – no começo do século 19 – do ‘tempo profundo’ da história do universo, da terra e da vida, levava à necessidade de crescente sistematização dos materiais que viriam a ser chamados de botânicos, zoológicos, geológicos e paleontológicos. Estava iniciada a era de ouro dos museus!

A partilha

O Brasil atendeu rapidamente – embora com seus meios precários – ao movimento europeu, fundando em 1818 o Museu Real (atual Museu Nacional), onde se acumularam obras de arte, objetos naturais e etnológicos, máquinas da nascente indústria... enfim, os sinais da complexa relação entre ‘natureza’ e ‘civilização’ que caracteriza o Ocidente tão fundamente.
A antropologia desengatou-se lentamente desse estranho amálgama. Ao final do século 19, tornou-se mais óbvio que os materiais relativos à ‘cultura’ ganhassem autonomia em relação à ‘natureza’, confirmando a partilha que se estabelecera entre as ciências naturais e as ‘humanas’.
Itens do acervo do Museu Nacional
Itens do acervo do Museu Nacional – à esquerda, guigós da coleção de zoologia; à direita, máscara trançada revestida de plumária javaé da seção de etnologia. Ao fim do século 19, materiais relativos à 'cultura' ganham autonomia em relação à 'natureza', confirmando a partilha que se estabelecera entre as ciências naturais e as 'humanas'. (fotos: Acervo Museu Nacional)
No Brasil, o marco foi a realização, em 1882, no Museu Nacional, da primeira Exposição Antropológica, dedicada às culturas indígenas de seu território, sob intenso interesse das elites e do Imperador. Logo os museus Paulista e Emílio Goeldi (em Belém do Pará) se juntariam à instituição carioca para a coleta e interpretação dos materiais antropológicos brasileiros.
A intensificação do pensamento antropológico ao longo do século 20 foi tornando a disciplina ao mesmo tempo mais abstrata e reflexiva e mais dependente da experiência direta e controlada da pesquisa de campo do que dos objetos da ‘cultura material’, fragmentados e classificados nos depósitos e galerias dos museus.
Sua mera existência carrega, porém, uma intensa força simbólica, a que continuamos sensíveis, dispostos a venerar nessas preciosas relíquias o testemunho físico dos mundos de sentido de que emergiram.
Em muitos casos, constituem relicários da identidade cultural ali envolvida, quer se trate da identidade nacional, quer de alguma outra identidade étnica ou tribal – ou mesmo da identidade da ‘cultura ocidental’, com sua peculiar atenção à diferença, à história e a alguma ordem universal.

Identidade e memória

Na recente 28ª Reunião Brasileira de Antropologia, ocorrida em São Paulo, realizou-se – em iniciativa conjunta da Associação Brasileira de Antropologia e do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram/ Ministério da Cultura) – o seminário ‘A antropologia vai aos museus; os museus vão à antropologia’.
Tratou-se aí da questão do ensino ampliado e da divulgação científica, do uso museológico dos recursos midiáticos e digitais, da relação entre o olhar do museu e o dos meios fotográficos e cinematográficos, dos direitos culturais das populações nativas ou tradicionais e do estatuto da ação e da performance no ambiente relativamente estático dos museus.
Proliferam iniciativas de valorização e legitimação dos modos de vida, das culturas, de segmentos dominados ou desfavorecidos das sociedades modernas
Na mesa de que participei – narrando as desventuras do Museu Nacional, abandonado como está pelo governo federal –, foi muito tratado o tema dos museus locais de identidade e memória, cujo número vem crescendo exponencialmente em toda parte. 
Ao lado das instituições tradicionais, de disposição mais universalista, como os museus ‘nacionais’ e os de ciência, proliferam atualmente importantes iniciativas de valorização e legitimação dos modos de vida, das culturas, de segmentos dominados ou desfavorecidos das sociedades modernas.
Quer se trate de culturas indígenas, de comunidades periféricas urbanas, de enclaves rurais ou de atividades artesanais ou alternativas, a disposição em registrar, objetivar, sistematizar testemunhos físicos, estáveis, dessas experiências identitárias parece tornar-se um recurso importante para a autoestima e para as lutas políticas de todos esses atores da cena pública moderna. Um bom exemplo é o do Museu da Maré (RJ), que se apresentou naquele seminário.
Museu da Maré
O Museu da Maré é representante do novo movimento museológico, no qual o foco são identidades e memórias locais, de segmentos desfavorecidos das sociedades modernas. (foto: Naldinho Lourenço/ Wikimedia Commons)
Essa é uma das muitas características dinâmicas que atravessam atualmente a relação entre museus, culturas e antropologias. A mesma tensão entre instituição e vida social se apresenta no desafio de tornar os museus mais ágeis e eficientes na comunicação com os saberes que representam e com as populações que desejam influenciar.
A mesma tensão entre instituição e vida social se apresenta no desafio de tornar os museus mais ágeis e eficientes na comunicação com os saberes que representam
Num momento em que a própria objetivação excessiva do conceito de ‘cultura’ é motivo de crítica no pensamento antropológico, a luta por representação e expressão ‘cultural’ dos grupos minoritários cresce na agenda circundante, impondo intensa reflexão e cuidadosa participação dos antropólogos na assessoria a tais iniciativas.
Grandes desafios para nossa museologia, amparada pelo ativo Ibram, mas sempre oscilando, como nossas classes populares, na linha intermediária entre a dura miséria e alguma digna pobreza.

Luiz Fernando Dias DuarteMuseu Nacional
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Sugestões de leitura: 

Abreu, Regina. Museus etnográficos e práticas de colecionamento: antropofagia dos sentidos. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, vol. 31, p.100-125, 2005.

Bourdieu, Pierre; Darbel, Alain. O amor pela arte: os museus de arte na Europa e seu público. São Paulo: EDUSP/Zouk, 2007.

Duarte, Luiz F. D. La nature nationale: entre l'universalisme scientifique et la particularité symbolique des nationsCivilisations, vol.52, n.2, p.21-44, 2005.

Santos, Myrian Sepúlveda. Museus brasileiros e política culturalRevista Brasileira de Ciências Sociais, vol.19, n.55, 2004.

Gonçalves, José Reginaldo Santos. Os museus e a representação do Brasil.Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, vol.31, p.254-273, 2005.

fonte:Por: Luiz Fernando Dias Duarte
Publicado em 03/08/2012 | Atualizado em 03/08/2012

Mostra reúne obras-primas do Impressionismo no CCBB



Mostra reúne 85 obras de artistas como Claude Monet, Pierre-Auguste Renoir e Vincent Van Gogh

São Paulo - O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) ficará aberto a madrugada do sábado (4) para domingo (5) por uma ótima razão: a chamada “Virada Impressionista”. A ação faz parte da mostra “Paris e a Modernidade: Obras-Primas do Acervo do Museu d’Orsay de Paris, França” e traz 85 obras de artistas como Claude Monet, Pierre-Auguste Renoir, Edouard Manet, Camille Pissaro, Edgar Degas e Vincent Van Gogh.
A mostra, que reúne as obras-primas dos pintores que produziam sem se preocupar com o retrato fiel passado pela retina, reflete o primeiro grande momento vanguardista parisiense, entre a segunda metade do século XIX e início do século XX. Para melhor apreciação do visitante, as peças foram divididas em seis módulos temáticos.
Obra Quarto em Arles, de Vincent Van Gogh
Nas sessões – por assim dizer – “Paris: a Cidade Moderna”, “A Vida Urbana e Seus Autores” e “Paris é Uma Festa” ficam os retratos do cotidiano burguês da Cidade Luz e seu exato oposto, como a vida de prostitutas, por exemplo. Na outra ponta, os módulos “Fugir da Cidade”, “Convite à Viagem” e “A Vida Silenciosa” reúnem obras de artistas que preferiram fugir do ritmo acelerado de Paris para refúgio interiorano francês. Entre eles, o holandês Van Gogh, que escolheu a cidadezinha de Arles.
O Que: Paris e a Modernidade: Obras-Primas do Acervo do Museu d’Orsay de Paris, França
Quando: até 7 de outubro
Onde: rua Álvares Penteado, 112, Sé – São Paulo
Quando: Grátis

fonte:

As peças em couro do artista Espedito Seleiro que vive em Nova Olinda na Chapada do Araripe, no Ceará, estarão em mostra exclusiva no Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular/Iphan/MinC, no Rio de Janeiro.



A partir de 02 agosto tem exposição Espedito Seleiro – da sela à passarela que mostra. 
Espedito Veloso de Carvalho, 72 anos, mais conhecido como mestre Espedito Seleiro, há décadas vem produzindo com a ajuda da família, vestimentas de vaqueiro, além de mobiliários e acessórios em couro. Seu trabalho tornou-se popular nos anos 80, ao recriar a estética do cangaço e os desenhos do gibão em sandálias, bolsas e cintos.

Seus acessórios entraram para o circuito fashion via São Paulo Fashion Week pela grife Cavalera, em 2006. Em 2007 a indumentária criada pelo mestre tornou-se figurino de Marcos Palmeira em O homem que desafiou o diabo, de Moacyr Goes.

O inventivo artesão, que mantém vivo o ofício tradicional de seleiro — que está em extinção — foi agraciado em 2011 com a Ordem do Mérito Cultural, do Ministério da Cultura.

Espedito Seleiro aprendeu ofício com o pai que fez sandálias para Lampião e Maria Bonita.

O inventivo artesão Espedito Seleiro mantém vivo no Brasil o ofício tradicional de seleiro -- que está em extinção.

Exposição Espedito Seleiro: da sela à passarela
Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP)
Rua do Catete, 179 (Metrô Rio, Estação Catete) – Rio de Janeiro – RJ
fonte: babeldasartes